Relação familiar: construção e significados no indivíduo.
Por: Rivane Montenegro
Eis um campo intensamente abordado, analisado, discutido, pesquisado, e que está sempre presente quando se trata de psicologia, por tratar da origem do indivíduo e as relações por ele estabelecidas.
Através da anamnese1 temos um levantamento da história de vida do paciente que proporcionará orientação às sessões terapêuticas subsequentes e este conteúdo servirão de base para maior compreensão de quem busca o acompanhamento.
A cultura descreve na mulher a tarefa de gerar, de procriar, e no homem o de prover a casa. Realidade esta cada vez mais transformada diante da dinâmica das relações e pelas trajetórias dos componentes responsáveis pela formação familiar. Os papéis não necessariamente devem ser representados da forma descrita acima, do ponto de vista da ‘ordem histórica’. Os contextos vão se alternando constantemente promovendo mudanças nos estilos e valores resultando ao indivíduo, novas formas de atuação.
Para a Psicologia é essencial o conhecimento profundo sobre o paciente, e de acordo a cada teoria abordada pelo profissional, este histórico familiar abarcará gerações anteriores a por ele vivida, como na Psicologia Analítica. Independente da abordagem teórica é essencial o conhecimento sobre as relações instauradas entre os componentes, que podem ser avaliadas e refletidas na realidade vivida pelo paciente.
Frequentemente nos confrontamos com situações semelhantes às experimentadas pelos pais e/ou avós, seja no campo do conflito ou de realizações que não estavam no plano desejado. O processo psicoterápico permite o ‘acesso’ a retrospectiva de situações às quais, até o momento, não fez parte da reflexão deste indivíduo e que, no atendimento com o psicólogo, se torna possível, trazendo a superfície, elementos que se ‘encaixam’ elaborando a compreensão das partes do todo deste sujeito.
O que pertence a você?
O que pertence a algum membro de sua família e que você reproduz?
O que é seu e o que é do outro?
São questionamentos que surgem ao se refletir sobre como nos vemos e como nos percebemos na relação familiar. Os registros feitos no indivíduo, ao longo da história de vida, possuem significados distintos, isto é, de acordo a maneira como foi apresentada e experimentada.
O relacionamento familiar compreende a composição pela diversidade de características individuais, onde cada componente irá inscrever a sua marca como parte de seu núcleo.
A conceituação de Albert Bandura sobre a expressão ‘intergeracionalidade’ através da aprendizagem social, que tem no princípio da modelação a aprendizagem da criança, onde a transmissão de conhecimentos não acontece somente pelo modo formal, mas também pautado na observação do comportamento dos adultos tidos como modelo.
A família é a primeira instituição com a qual os indivíduos mantêm contato e estabelecem relações, sendo ela responsável pela educação e socialização de seus membros (Lima, 1999; Campos, 2004; Ceberio, 2006).
Geralmente a família é a primeira instituição com a qual o indivíduo mantém contato e responsável pelo aprendizado dos principais padrões de comportamento e modelos de socialização, o que lhes permite não somente a reprodução, mas também o desenvolvimento de novas relações, parentesco, de amizade, laborais, até a construção de uma nova família (Macêdo e Monteiro, 2004).
O estudo da família nessa transmissão de valores, modelos de conduta, crenças e sentimentos, aborda a transgeracionalidade, intergeracionalidade ou transmissão intergeracional. Este estudo da geracionalidade parte do pressuposto de que o indivíduo recebe influências da família, mas que não se restringem ao contexto nuclear, e extrapolam-se a outros familiares, pois, os pais desta criança receberam estas informações de seus respectivos pais. ‘Assim, a maneira como os pais ensinam seus filhos a passar pelos momentos de crise, por exemplo, não depende somente da família nuclear, mas dos legados familiares deixados pelas gerações passadas’ (Penso, Costa e Ribeiro, 2008).2
Conforme citado anteriormente, o indivíduo pode vivenciar situações semelhantes às experimentadas pelos seus pais ou avós, e até repeti-las, e podem também modificar criativamente de acordo a sua percepção.
Neste processo de construção o indivíduo vai obtendo o significado para cada campo de sua estrutura e através dele irá ressignificar as suas relações. É neste cenário que os sentimentos vêm à tona, remetendo o indivíduo a sensações que podem ocasionar desconforto pelo teor da vivência estabelecida inicialmente e o conflito ao vivê-la no momento atual, por tratar-se da mesma pessoa em período distinto. Ressalto que o acompanhamento psicológico faz parte deste processo reflexivo e de ressignificação do indivíduo no significado e simbologia das relações.
1 Captação de informações sobre a história de vida do paciente que deverá ser realizada na consulta inicial. Quanto mais detalhada anamnese maiores condições para elaboração do plano terapêutico.
2 Psicologia de família: teoria, avaliação e intervenções/Organizadores, Makilim Nunes Baptista,
Maycoln L. M. Teodoro. – Porto Alegre: Artmed, 2012.